terça-feira, 2 de agosto de 2011

“DESINDUSTRIALIZAÇÃO”


É o debate atual, e você necessita conhecer bem, por que no fim das contas afeta a todos os brasileiros.

Desindustrialização é o nome que tem sido dado ao fato de a indústria brasileira estar perdendo, em rapidez inimaginada, participação na composição do PIB anual.

Desse modo, necessitamos combinar o que vem a ser o tal PIB. PIB, ou Produto Interno Bruto, é a soma de todas as riquezas (por sua vez, bens, mercadorias, e serviços) produzidas em um país em dado ano.

Então desindustrialização é o fato de a indústria estar contribuindo cada vez menos à composição do PIB brasileiro. Não que ela não estivesse crescendo (e, no momento, não cresce), mas é que o percentual da contribuição da indústria à composição do PIB vem caindo sensivelmente, de forma que não se imaginava que viesse a acontecer, de uns cinco anos pra cá.

Não é só a indústria que contribui à formação do PIB, evidentemente, e em momento algum foi. A economia é formada por 3 setores: o setor primário, agricultura, pesca, aquacultura, pecuária; o setor secundário, aqui desmembrado em mineração e indústria de transformação; e o terciário, os serviços.

Só pra que possamos entender melhor, revisemos que são serviços: serviços de profissionais liberais, como arquitetos, advogados, médicos etc, serviços profissionais, como barbeiros, carpinteiros, encanadores, gasistas etc, educação, saúde, turismo, transportes, comunicações, serviços financeiros, entretenimento, comércio, comércio exterior etc.

Normalmente, não existe serviço desacompanhado de bem, nem bem totalmente desatrelado a algum serviço. Os serviços são mais presentes na vida das pessoas, principalmente as citadinas, que os demais setores, a ponto de muitos avaliarem que serviços são tudo. O mais atual conceito de serviços entende que mesmo em uma fábrica, a maior parcela das atividades na verdade é de serviços; por exemplo, a própria gestão, o serviço de segurança, as atividades de RH, de marketing, de finanças, de logística, de estratégia; enfim, só seria realmente indústria a atividade de transformação, aquela desempenhada na linha de produção.

Mesmo utilizando noção de serviço meno abrangente, sabe-se que as atividades de serviços são as mais importantes, economica e socialmente, dentre essas três.

Por exemplo, estatísticas oficiais americanas dão conta que, no início da década passada, nada menos que 91% do PIB era de serviços, apenas 7% era da indústria e somente 2% originava-se na agropecuária.

E os empregos acompanhavam tal distribuição, ou seja, cerca de 91% dos empregos eram do setor terciário, 7% de indústria e 2% do setor primário.

Aqui mesmo no Brasil, o censo econômico de 2005 detectou que 65% do PIB brasileiro era originado nos serviços, portanto, o setor terciário sozinho gerava quase tanta riqueza quanto o dobro da soma dos outros dois setores.

Em 2010 já se descobriu que nada menos que 69% do PIB vem dos serviços, e o percentual dos empregos é semelhante, portanto, os serviços já geram mais empregos que o dobro da soma empregos gerados pelos outros dois setores.

Em toda economia, ao longo do tempo, o fenômeno do crescimento relativo dos serviços acontece. Conforme a economia cresce e se sofistica, mais os serviços veem a preponderar.

Mas, aqui no Brasil, recentemente, vem acontecendo algo que não aconteceu, modo geral, nas economias que “amadureceram”.

Devido ao fato de a agropecuária brasileira ser a segunda do mundo, e a que mais espaço e ímpeto de crescimento possui, também o setor primário vem contribuindo progressivamente mais ao PIB que a indústria, principalmente que a indústria de transformação.

Como as economias mais fracas veem crescendo mais que as desenvolvidas, a quantidade de pessoas que passam a poder se alimentar mais e melhor também cresce, e muito, o que estimula o crescimento de nossa agricultura. Também tal fato se dá por que é muito grande o crescimento populacional em tais economias, o que gera crescente quantidade de bocas a alimentar. Tudo isso favorece o crescimento de nossa agricultura, e a própria FAO, considerando que a população mundial só se estabilizará ao chegar ao número de 9 bilhões de habitantes, quando atualmente ainda é de 6,5 bilhões, instou o Brasil a expandir sua produção de alimentos em 40% até 2020, pra ajudar a alimentar não só o que já alimenta e o mais de 1 bilhão de pessoas consideradas como vivendo com fome que já existe.

Então, a tendencia ao crescimento relativo dos serviços é seguida, no caso brasileiro, pela tendencia a expansão agrícola estimulada pelo ambiente externo.

Mas há outras causas pra diminuição relativa da importância da indústria.

Há causas culturais: indústria de transformação prospera principalmente em ambientes onde predomina a cultura da iniciativa, da competitividade e da inovação, todas frontalmente contrárias à cultura brasileira de acomodação, e de se fazer sempre a mesma coisa, e fazê-la sempre do mesmo jeito - cultura tradicionalista, ou seja, antiinovação - e de autoritarismo paternalista, ou seja, antiiniciativa.

Competitividade internacional é qualidade + produtividade + preço, e, por imposições culturais – más concepções gerencias - e econômicas – alta carga de impostos, alta taxa de juros, deficiente estrutura física, taxa cambial etc – nossa competitividade é pequena, porém esses fatores afetam todos 3 setores em vez de afetarem apenas a indústria, portanto tais fatores não explicam a perda relativa de importância da indústria na economia nacional.

Então, e se lembrarmos da frase proferida pelo Presidente do IPEA, Márcio Pochman, “a China será a fábrica do mundo, a Índia, o escritório do mundo, e o Brasil a fazenda do mundo”, perceberemos que a inegável vocação industrial chinesa e a inafastável vocação agrícola e mineral brasileira - vocação cultural por commodities, ou seja, por fazer sempre as mesmas coisas e sempre do mesmo jeito – é que definem que, no Brasil, acontece que a indústria tende a perder relevancia até perante a agricultura, diferentemente do que aconteceu com outras economias à medida que se desenvolveram.

O conservadorismo mental, a ojeriza à competição, as crenças em que: a hierarquia é existencial, chefes devem ser inacessíveis, poderosos têm direito a privilégios, as opiniões devem ser grupais, o que é do grupo é justo, bom e correto e o que é diferente não presta, discordancias e competição são indesejáveis, a intolerância a pessoas e idéias diferentes, a preocupação em evitar erros, a necessidade absoluta de regras, a preferencia por trabalhar muito em vez de trabalhar bem, a crença encastelada na mente brasileira típica segundo a qual os recursos naturais, abundantes, garantirão a abundancia econômica (crença que jamais se materializou, por que onde quer que o país evoluiu, o fez investindo em ciência, tecnologia, educação e treinamento), compõem o quadro mental que melhor se amolda a atividades que menos exigem do intelecto e da capacidade de inovação, o que, aliado ao eterno baixo nível educacional, apontam pra uma maior adequação da cultura brasileira à produção de commodities.

O Japão vivia uma cultura bastante semelhante, no século 19, o que foi mudada pela chamada Revolução Cultural, uma mudança que levou várias décadas pra se perenizar, empreendida por toda uma dinastia, a dinastia Meiji.

Então, percebe-se que, pra mudar a estrutura econômica e cultural brasileira, é necessário persistir em mudança por décadas: é mudar a economia e a cultura, ao mesmo tempo, e por muito tempo. Desse modo, serão necessários várias lideranças sucessivas que busquem melhorar as estruturas econômicas e culturais, muita persistência e muita aceitação às mudanças, justamente o contrário do que agora acontece.


O Mestre em Administração pelo IBMEC e Especialista em Gestão da Qualidade pela FGV José Carlos Fontes é ex-Conselheiro da Presidência de ONG, Coordenador e Professor de cursos de Pós Graduação.

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